No decorrer do texto, podemos observar com clareza o paralelo entre os dois testamentos bíblicos. Qualquer bom teólogo que venha relatar algum dos aspectos — político, histórico ou teológico — do Novo Testamento deve atentar-se, inescapavelmente, ao Antigo Testamento. Embora muito tenha sido escrito, por diversos mestres, sobre teologia, Escritura e suas nuances, chama a atenção o vasto arcabouço de literatura paralela à Bíblia usado pelo autor. Por óbvio, não poderia ser diferente, tendo em vista as lacunas deixadas pelo tempo e pela história, às quais a Bíblia não pôde se ater, mas para as quais referências bibliográficas podem servir como auxílio e, por vezes, como base primordial. No caso desta última situação, o leitor precisa estar despido, pelo menos em algum nível, de pressupostos teológicos fundamentalistas, pois, neste ensaio, é com essa bagagem histórica e teológica — separando com destreza e imprescindibilidade um elemento do outro — que o autor nos leva a uma reflexão singular sobre os tópicos propostos no título.

Resultado da tradição oral dos primeiros crentes da era cristã, os apócrifos tornaram-se importantes documentos reveladores do modo como vivia e pensava uma grande parcela da cristandade, cuja voz ficou abafada pela igreja oficial. Produzidos para satisfazer as curiosidades populares a respeito da infância de Jesus e de seus pais, bem como estabelecer as raízes da nova religião, tais escritos revelam, por um lado, as idiossincrasias do pensamento e das práticas judaicas que marcaram a origem do cristianismo e, por outro lado, refletem a efervescente e plural cultura gentílica com a qual o cristianismo passou a lidar cotidianamente em seu processo de expansão.